É como se eu precisasse entendê-la para poder aceita-la. Tenho a necessidade de conseguir compreender a sua frieza, sua escuridão, seus mistérios e suas dores para poder percebê-la como a única certeza que temos em nossas vidas.
Sempre me impressionei muito com as perdas e as lembranças tristes me acompanham desde a infância. Lembro-me do baque que foi a notícia da morte de meu bisavô em meados de 1994. Na época eu tinha apenas sete anos mas um carinho enorme por aquele senhor de cabelos branquinhos, que mal podia falar ou andar e que sempre foi muito simpático ao nos receber em sua casa, no interior do município de Pirapó. A imagem do sepultamento do corpo do “bisa” (era assim que eu o chamava) jamais saiu de minha cabeça e a partir daquele momento eu passei a temer a perda daqueles que amo.
Entretanto, esse momento chegou. Depois de muitos anos lutando contra problemas respiratórios um dos amores da minha vida partiu. A notícia chegou próximo das 23h. Lembro que eu me preparava para dormir. Eu era criança ainda e, portanto, incapaz de tomar qualquer providencia necessária naquele momento. O que eu podia fazer era ficar em casa cuidando daqueles que, naquela hora, estavam menos preparados do que eu. Ao colocar a “Nuxi” para dormir e encostar minha cabeça no travesseiro consegui “derrubar” a ficha: sim, o “nono” havia partido. Mais uma dor enorme embora eu soubesse que era o melhor para ele. Mas, nunca entendi como o meu segundo pai estava em um quarto de hospital, acordado as 18h e, pouco depois, já não estava mais entre nós. A imagem de seu corpo coberto de flores brancas com miolos amarelos jamais saiu da minha “caixinha de lembranças”.
O medo passou a fazer parte dos meus dias e, ao mesmo tempo, a dificuldade de entender o momento da “passagem” me preocupava. Lembro que certa vez, ao acompanhar a despedida da irmã de um grande amigo, vítima de um acidente de carro, a única coisa que eu conseguia pensar era no desejo de partir antes de mais um dos amores de minha vida, já que me considerava incapaz de suportar a dor que aquela família passava naquele momento. Egoísmo¿ Medo¿ Não sei. Mas era a única coisa que passava na minha cabeça durante o dia.
Mas, minha dificuldade real sempre foi em entender como uma pessoa pode estar viva e, em poucos instantes, morta. Essa falta de entendimento se intensificou em 2010. Vi minha avó passar sete dias em coma e segurei a sua mão quando a respiração começou a se tornar mais lenta, até cessar. Jamais entendi o olhar que ela apontou em minha direção poucos segundos antes do ultimo suspiro, depois de ter passado mais de uma semana sem manifestar qualquer reação a nada. Muito menos um olhar em alguma direção. Em poucos segundos acompanhei o fim de uma vida inteira. Era, e continua sendo, impossível se compreender.
Hoje, escrevo essas linhas após passar mais um dia e uma madrugada sem dormir pensando em alguma forma de superar toda a angústia que sinto ao pensar na morte. A notícia do falecimento trágico de um ex-colega e ex “par” de danças típicas alemãs me faz, mais uma vez, sentir a necessidade de entender o que é a morte. As pessoas próximas a mim sabem que convivo diariamente com o medo da partida de um dos maiores amores da minha vida. Embora eu acredite que, enquanto houver 1% de possibilidade de cura, vale a pena lutar por uma vida, eu continuo sem saber e, consequentemente, sem ser capaz de aceitar a única certeza da vida: a morte.
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